Há Cada Vez Mais Gente a Mexer no Nosso Queijo

sábado, 18 agosto 2018 14:09 Escrito por 

PARTE 8/14: O queijo na moderna distribuição

O consumo de queijo em Portugal ronda os 11 kg/hab/ano, ou, se quisermos, as 110 mil toneladas, considerando a população portuguesa que ronda os 10 milhões de habitantes.

Destes 11 kg, 7,5 correspondem a compras directas dos vários tipos de queijo por parte do consumidor, enquanto os 3,5 kg restantes se referem a queijo consumido, dentro e fora de casa, mas incluído noutros produtos.

Por exemplo, os queijos das tostas mistas, francesinhas, pizzas ou saladas, que ingerimos em estabelecimentos do canal horeca, ou o queijo utilizado nas unidades de restauração colectiva (cantinas, hospitais,…) ou ainda todo o queijo incluído em refeições pré-confecionadas, frescas ou congeladas, que compramos em supermercados, mercearias ou outro tipo de estabelecimentos comerciais.

Sobre este ultimo tipo de consumo, a que vulgarmente designamos como queijo-ingrediente, não me irei debruçar, mas em relação ao restante, há dois dados que interessa referir: é a categoria de produto cujas vendas, em valor, ocupa o primeiro lugar do ranking de produtos no universo do grande consumo (avaliado pela consultora Nielsen) e que quase 70% das vendas de queijo em Portugal são efectuadas em lojas da moderna distribuição: lojas de proximidade, super e hipermercados.

É, por isso, da maior relevância perceber o posicionamento, a atenção e o tratamento que é dado ao queijos nesses espaços das grandes cadeias, não esquecendo, desde logo, que não são apenas os particulares, para consumo no lar, aqueles que compram queijo nos supermercados. Muitos estabelecimentos do canal horeca, pela comodidade de comprarem sem limitações de tempo de espera ou de quantidade mínima, optam por fazer aqui as suas compras, aproveitando até a possibilidade de usufruir das promoções sistemáticas que aí são realizadas.

O sortido nestas lojas tem uma relação muito próxima com a área do estabelecimento e, obviamente, em lojas de maior dimensão é, normalmente, encontrado um mais amplo sortido.
Também a respectiva localização e o enquadramento em termos de classes socioecónomicas da população abrangida tende a interferir com a selecção de produtos disponibilizada.

Os queijos estão normalmente divididos entre a zona de charcutaria, com queijos a peso e a corte e a área específica de livre-serviço, onde estão os fatiados, unidoses e outros pré-embalados. A selecção encontrada é, em geral, bastante conservadora, com um número limitado de marcas das tipologias mais vendáveis, havendo, no entanto, os períodos das feiras, quase sempre combinadas e aproveitando as principais feiras de vinhos, em que a oferta se alarga um pouco, muito embora em condições de exposição e conservação pouco apropriadas, tornando muito rapidamente a respectiva venda pouco apelativa.

A conservação e reposição dos produtos, em especial dos queijos que carecem de maiores cuidados, deixa, em demasiadas lojas, muito a desejar, sendo que os mesmos adquirem rapidamente um aspecto exterior e uma alteração de características que afastam facilmente o consumidor e que levam à necessidade de, frequentemente, promover promoções agressivas para escoamento dos stocks existentes ou a exigir a respectiva troca pelos fornecedores, quando tal esteja contratualmente previsto.

Outra situação que gera alguma perplexidade é a relacionada com a política de preços aplicada a esta categoria. Primeiro, refiram-se as margens absurdas (e os preços de aquisição ao fornecedor absurdamente baixos) aplicadas a muitos dos queijos disponíveis. Depois e salvo em produtos muito concretos (fatiados de marcas-líder), o consumidor dificilmente terá presente o preço ‘normal’ de cada um dos queijos disponíveis nos lineares. Tal, contudo, não justifica algumas incongruências facilmente detectáveis.

Alguns exemplos: perceber que um queijo cortado e embalado em quartos ou fatiado embalado apresenta um preço/quilo inferior ao do mesmo queijo inteiro; colocar um preço superior nos queijos de menor cura, relativamente aos seus equivalentes de cura mais prolongada; colocar preços/quilo em queijos banais superiores aos de queijos muitos mais trabalhados e apaladados, fabricados, por exemplo, a partir de leite de cabra ou de ovelha… e por aí adiante.

Em relação aos queijos estrangeiros, tirando as sempre estimáveis excepções dos Supermercados Apolónia (verdadeiramente uma referência a este nível) no Algarve e do El Corte Inglés, e em grau muito menor, os hipermercados mais relevantes Continente e Jumbo, a oferta é medíocre, contém apenas umas cinco ou seis opções e as referências são sempre ou da marca do próprio supermercado ou das marcas comerciais mais massificadas.

Sendo, reconhecidamente, os nossos supermercados de qualidade bastante superior aos que podemos encontrar na larga maioria dos países europeus, é também verdade que para um verdadeiro apreciador de queijo, a visita a um supermercado médio em França ou Espanha, na Itália ou na Suíça, na Áustria, na Holanda ou no Reino Unido é muito mais gratificante do que a visita às lojas das nossas principais cadeias de distribuição.

Este conjunto de dados e o facto de, como referi anteriormente, quase 70% dos queijos serem comprados nas lojas das maiores insígnias, ajuda, de certo modo, a perceber a dificuldade em criar uma cultura queijófila em Portugal.

Continua... 

Parte Nº

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